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Demissões em massa nas empresas de tecnologia são apenas mais um dia no liquidificador – Notícias

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Berço de tantas revoluções tecnológicas e inovações na organização do trabalho, o Vale do Silício está lançando outra novidade: as demissões desnecessárias.


Duzentos e sessenta mil postos de trabalho foram perdidos no ano passado. Foi a maior “carnificina” desde o colapso das empresas “ponto com”, mais de duas décadas atrás. As grandes companhias tecnológicas não dão sinais de abrandamento dessa tendência em 2024, embora sejam majoritariamente e, em alguns casos, substancialmente lucrativas.



Como elas mesmas dizem, estão despedindo profissionais para promover o processo contínuo de alinhamento de sua estrutura com suas principais prioridades, ou “transformação” ou “preparação para o futuro”. No entanto, por detrás dessas generalidades, algumas empresas tecnológicas estão utilizando o que, até agora, tem sido uma medida extrema para criar um aumento de curto prazo no sentimento do mercado, ou seja, na maneira como são vistas por especialistas e mesmo pela sociedade.



De fato, os investidores ficaram entusiasmados. Vejam o caso das ações da Meta (a empresa que controla o Facebook e o Whatsapp), por exemplo, que subiram mais de 170% em meio ao debate sobre seu redimensionamento (downsizing). E sabemos que para onde vão os preços das ações é geralmente para onde vão os executivos-chefes, o que significa que não vai demorar muito até que a onda de demissões desnecessárias apareça em outra empresa de capital aberto.

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Essas marés de demissões agitam e perturbam continuamente os dias de trabalho em empresas do mundo inteiro. Quem já passou algum tempo trabalhando em uma companhia de qualquer dimensão, está familiarizado com o que chamo de “vida no liquidificador”: a incerteza implacável e a perturbação constante que caracterizam a vida empresarial na atualidade. Querem alguns exemplos? Quando um novo líder assume novas funções, inicia imediatamente uma reorganização que altera as relações de subordinação a que a equipe estava habituada; se um consultor sugere uma nova estratégia, que ocupa o tempo e a atenção de toda a equipe durante meses, o que sobra desse processo é uma nova declaração de missão e um novo Power Point, até que tudo volte a ser como antes. E que tal esta? A preferida de muitos: uma fusão é anunciada e leva a tudo isso junto, e muito mais.


Entretanto, nenhuma empresa prospera ficando parada, e não há melhorias sem mudanças. De tempos em tempos, são necessárias correções de rumo, reorganizações e alterações de eixos estratégicos. Mudanças tecnológicas exigem a reestruturação dos principais setores. Mas, ao longo dos últimos 25 anos, a ideia de disrupção também se transformou em uma espécie de culto. Mudar o rumo natural de um processo se tornou um credo que afirma que tudo deve ser alterado, a toda hora, e que, se não estivermos mudando, estaremos perdendo algo.


É possível frequentar cursos sobre disrupção nas escolas de gestão de Stanford, Cornell, Columbia e Harvard. Pode-se ler na capa de uma das principais revistas de negócios a seguinte manchete: “Construir uma equipe de liderança para a transformação: O futuro da sua organização depende disso”. E se o que se quer é, simplesmente, reafirmar o caos, há cartazes inspiradores que entoam os slogans: “Falhar rapidamente; romper ou ser rompido; mover-se rapidamente e quebrar coisas.” Parte disso, claro, é produto da arrogância dos tecnólogos do Vale do Silício. Mas uma parte é também a crença de que a tarefa fundamental de um líder é instigar a mudança. Esse paradigma se arraigou de tal forma que é até difícil lembrar se existiu algum momento em que havia outra ideia sobre a melhor forma de gerir uma empresa.


Além disso, a maioria dos executivos – ao lado dos consultores e banqueiros que os aconselham, os investidores que os estimulam e os analistas financeiros que avaliam seus esforços – foi educada de acordo com o credo da mudança. A constante agitação se torna uma espécie de roda: um líder instiga alguma mudança, porque é isso que um líder faz; os consultores, investidores e analistas reagem positivamente, porque lhes foi ensinado que a mudança é sempre boa; e, quando há um rápido aumento da reputação ou do preço das ações, ou de ambos, os executivos pagos, sobretudo em ações, sentem que foram devidamente recompensados por maximizar o valor dos estoques para os acionistas. E, depois, todos passam para a inexorável fase posterior: outra mudança.

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Não está claro, porém, se isso traz o resultado desejado. Estudos sobre fusões e aquisições apontam que esses movimentos corroem – em vez de aumentar – o valor das ações ordinárias na ordem de 60 a 90%. Jeffrey Pfeffer, professor da Escola de Negócios de Stanford, argumentou que as demissões raramente resultam em custos mais baixos, aumento da produtividade ou solução para os problemas subjacentes de uma empresa; e poucos que passaram por reorganizações não se lembrarão delas como uma ocasião de súbito florescimento da produtividade ou da criatividade.


Vista pelos olhos das pessoas que estão na linha de frente, a razão para essa diferença entre a intenção e o resultado se torna mais evidente. Afinal, quando pessoas começam a ser transferidas, ou quando começam, subitamente, a trabalhar para um novo chefe que ainda não está convencido da competência da equipe, fica difícil acreditar que toda a mudança e a agitação na empresa vão levar a grandes melhorias.


“É exaustivo”, me disse uma pessoa com quem conversei sobre mudanças no ambiente de trabalho. “É de sugar a alma”, comentou outra. Uma terceira me revelou que, depois da junção de dois departamentos, seu pessoal parecia um bando de gatos paralisados por faróis, sem saber no que deveria trabalhar. Outra pessoa contou que teve 19 gerentes em dez anos. Outra ainda afirmou que a mudança constante drena a energia do trabalho: “Você diz as coisas certas nas reuniões, mas, não necessariamente, faz o que é preciso ser feito para que o que foi dito se concretize.” Outra aprendeu a observar os gerentes e ficar atento quando paravam de aparecer ou de se comunicar: “É como antes de um tsunâmi, quando a água some. Você não vê a água, e então o tsunâmi vem, de repente, com força. Por isso, quando tudo está calmo, eu me preocupo.”

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Conversei com dezenas de pessoas, e cada uma delas compartilhou alguma história sobre uma mudança que deu errado. As reações vão mais além do que a simples frustração ou o descontentamento. Estão enraizadas na resposta psicológica que nós, seres humanos, experimentamos quando nosso senso de estabilidade é abalado e nosso futuro parece incerto. De fato, a literatura científica tem logrado esclarecer exatamente por que a vida no liquidificador é tão difícil para nós.


Pesquisadores de comportamento descobriram, por exemplo, que nosso stress é maior quando o medo, e não o desconforto, está no seu auge – e a incerteza é o cartão de visita da mudança no trabalho. Depois, há outra questão: uma conhecida série de experimentos conduzidos por Steven Maier e Martin Seligman, na década de 1960, descobriu que, quando sentimos que não estamos no controle de uma situação, desistimos de tentar melhorar as coisas – é o que se chama de “desamparo aprendido” se instalando.


Outros investigadores descreveram uma de nossas necessidades fundamentais como espécie: a importância que damos aos agrupamentos sociais. Isso ajuda a explicar por que não gostamos quando nossas equipes são desmontadas, reorganizadas e remontadas. Pesquisadores também demonstraram que – talvez sem surpresa – existe uma necessidade profunda de que as coisas façam sentido em nosso ambiente – necessidade que é muitas vezes frustrada, geralmente pelo CEO da empresa, que comunica com linguagem exagerada a maioria das iniciativas de mudança.


Embora a resposta essencial do animal humano à incerteza e à perturbação seja parte de sua natureza, o grau de mudança que introduzimos nos nossos locais de trabalho não o é. E, muitas vezes, é uma escolha deliberada. Chegamos a esse ponto porque o mundo dos negócios parece ter decidido que a mudança é um bem puro e, portanto, não existe uma quantidade excessiva e nenhum custo que seja elevado demais.


Mas se mais líderes forem guiados pela ciência da mudança ou pelas histórias que as pessoas na linha de frente compartilham, descobrirão, rapidamente, que a estabilidade é a base da melhoria. Primeiro, é preciso começar a respeitar as necessidades psicológicas das pessoas no ambiente de trabalho; depois, pensar duas vezes antes de lançar a “maravilhosa” próxima iniciativa de mudança e, finalmente, prestar mais atenção aos rituais e aos relacionamentos, permitindo a todos juntar os esforços para seguir em uma direção útil. Só assim poderemos começar fazer justiça à ideia de que uma empresa deve ser, em primeiro lugar, uma plataforma para a contribuição humana, se quiser realmente mudar algo.


c. 2024 The New York Times Company


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